Com Renato Borghi, Elcio Seixas e Georgette Fadel, Peça-referência contra o autoritarismo foi lançada nacionalmente em 1973 pelo Teatro Vivo
Da Redação – O espetáculo O que mantém um homem vivo? Estreia dia 16 de novembro, no Teatro Anchieta, às 21h e coloca para o público as contundentes reflexões de Brecht sobre a natureza do homem e suas contradições sociais.
A primeira montagem da peça estreou no final de 1973. O espetáculo rodou o Brasil todo e manteve-se em cartaz até 1977, levando milhares de espectadores ao teatro, com destaque para a presença da comunidade estudantil. Os estudantes da época viram a peça como um canal de expressão para questões urgentes que inquietavam a sociedade brasileira naqueles anos de forte repressão.
A peça marcou o nascimento do Teatro Vivo, companhia que Renato Borghi criou com Esther Góes em 1972, quando deixou o Teatro Oficina, grupo do qual foi fundador e onde esteve por quatorze anos, consagrando-se como um dos maiores atores do país. A montagem original foi dirigida pelo próprio Borghi, com a codireção de José Antônio de Souza.
Anos mais tarde, em 1982, às vésperas da redemocratização, o texto teve uma segunda montagem, não menos impactante, no TBC e novamente estrelada por Renato e Esther, mas desta vez, com direção de Elias Andreato e Marcio Aurélio.
Quase cinco décadas depois da estreia, a peça ganha uma nova versão pelo Teatro Promíscuo, também dirigida por Borghi, que agora divide a cena com Elcio Nogueira Seixas e Georgette Fadel. O QUE MANTÉM UM HOMEM VIVO? se impõe, uma vez mais, como voz crítica e ato de resistência lúcida e criativa diante de um quadro preocupante de ataques aos valores democráticos, ameaça de retrocessos no campo dos direitos humanos e das liberdades civis. Atento ao momento explosivo que o Brasil atravessa, o Teatro Promíscuo, companhia fundada por Borghi e Elcio Nogueira Seixas em 1993, buscou em seus arquivos o roteiro original da peça, datilografado em uma antiga Olivetti por Renato Borghi e Esther Góes durante o período mais sombrio dos anos de chumbo. O retorno de “O Rei da Vela” em 2017 (com Borghi novamente brilhando com seu Abelardo I) e de “Roda Viva”, em 2018, cinquenta anos após suas estreias, causaram comoção e tiveram consecutivas temporadas com ingressos esgotados exatamente por lembrar ao público que o perigo do autoritarismo está sempre à espreita e que “é preciso estar atento e forte” para enfrentar esta ameaça.
Permeado pelo humor mordaz do dramaturgo alemão e pelas músicas de Kurt Weill, Hanns Eisler, Paul Dessau e Jards Macalé, os três atores se alternam em mais de vinte personagens sem sair do tablado. O roteiro se divide em quatro unidades que tratam de valores fundamentais da humanidade: Bondade, Ciência, Justiça e Amor. A peça conta ainda com um prólogo, um entreato musical e um epílogo, todos abordando temas de discussão emergencial nos dias de hoje: igualdade, liberdade, identidade, solidariedade, educação, entre outros. Como sobreviver e manter sua humanidade em tempos de miséria, desalento, intolerância, censura, repressão e violência? O que mantém um homem vivo? A pergunta-título da peça é o desafio que Bertolt Brecht propõe ao público através deste espetáculo.
O QUE MANTÉM UM HOMEM VIVO? tornou-se se referência por sua postura crítica em relação ao autoritarismo e seus efeitos sobre o indivíduo e a sociedade. Assim como “O Rei da Vela” e “Galileu Galilei” (ambos estrelados por Renato Borghi), além de “Roda Viva”, marcaram os anos 60 como espetáculos que desafiaram a nova ordem ditatorial nascida com o golpe de 1964, O QUE MANTÉM UM HOMEM VIVO?, no início da década seguinte, marcada por censura feroz e repressão violenta, teve protagonismo semelhante.
Nesta nova encenação de Borghi, a linha estética rústica e despojada do espetáculo original se mantém. Os cenários de Daniela Thomas e os figurinos de Cassio Brasil têm como norte a tradução desta linguagem concreta para o mundo atual, o que significa explorar materiais produzidos e descartados em massa pela acelerada sociedade de consumo do século XXI. Renato Borghi também preserva, na nova montagem, a clareza na exposição das cenas e o humor cáustico que imprimiu à primeira performance, surpreendendo a crítica. Em consonância com o que pôde observar diretamente em sua passagem pelo Berliner Ensemble, Borghi aposta em sua direção no recurso épico como um elemento que desperta a atenção do espectador e o coloca em estado de curiosidade permanente, o que contribui para que o espetáculo mantenha uma dinâmica ágil e ofereça ao público uma experiência inquietante, um exercício da capacidade de pensar.
As músicas de Kurt Weill, Hanns Eisler, Paul Dessau e Jards Macalé, que, na versão de 73, tiveram arranjos do maestro Paulo Herculano, desta vez, ficam aos cuidados do igualmente criativo maestro Gilson Fukushima (“O Mistério de Irma Vap”; “Molière”; “O Grande Sucesso”), que pretende manter o colorido circense obtido por Herculano na primeira orquestração, mas valendo-se das novas técnicas disponíveis e de sonoridades mais diversificadas para que a música do espetáculo também soe contemporânea.
Serviço – Espetáculo O que mantém um homem vivo, de 16 de novembro a 15 de dezembro; quinta a sábado, às 21h; domingo às 18h, no Teatro Anchieta (280 lugares) no Sesc Consolação (Rua Doutor Vila Nova, 245, São Paulo – SP Informações: 3234 3000) Classificação: Não recomendado para menores de 14 anos. Ingresso: R$ 12,00 (trabalhador do comércio de bens, serviços e turismo matriculados no Sesc e dependentes/Credencial Plena) | R$ 20,00 (aposentado, pessoa com mais de 60 anos, pessoa com deficiência, estudante e servidor de escola pública com comprovante) | R$ 40,00 (inteira)
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