* Carlos Trindade – Com o retorno das aulas presenciais na maioria dos estados brasileiros neste mês de agosto, a prioridade, além de manter os cuidados necessários à proteção da saúde dos alunos, professores e funcionários, é recuperar o tempo perdido e reparar, o mais rapidamente possível, a defasagem provocada pelo longo período no qual os estudantes ficaram distantes do ambiente escolar. Nesse sentido, cabe alertar as autoridades para relatório que acaba de ser divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), que contém informações relevantes sobre a questão.
A despeito do ensino virtual adotado por grande parte dos países ter contribuído para que se mantivessem minimamente as agendas dos anos letivos, o necessário fechamento de escolas na luta contra o contágio da Covid-19 representou a substituição de uma cultura escolar de “segurança, amigos e comida” por “ansiedade, violência e até aumento da gravidez na adolescência”. Deve ser considerado, ainda, o fato de que o aprendizado remoto tem sido inacessível para cerca de um terço das crianças em idade escolar em todo o mundo. Dada a gravidade da situação, que atinge contingente expressivo de alunos brasileiros, é determinante que os governos federal, estaduais e municipais, conforme recomenda a Unicef, protejam o orçamento da educação.
Outra sugestão pertinente é que as matrículas sejam estendidas a crianças que já estavam fora da escola antes da pandemia. Segundo estudo anterior do organismo multilateral, divulgado em maio último e intitulado Cenário da Exclusão Escolar no Brasil – um Alerta sobre os Impactos da Pandemia da Covid-19 na Educação, tínhamos em nosso país, em 2019, 1,1 milhão de crianças e adolescentes de quatro a 17 anos sem acesso à educação. O número, já suficientemente preocupante, aumentou em 2020 para 5,1 milhões, dos quais 3,7 milhões estavam oficialmente matriculados, mas não tiveram como manter o aprendizado em casa.
Corroborando com os riscos para crianças e adolescentes fora da escola apontados pela Unicef, as Nações Unidas divulgaram informação grave sobre o tráfico humano, num cenário no qual a pandemia empurrou 124 milhões de pessoas para a pobreza extrema, agravando sua vulnerabilidade ante essa atividade criminosa. Na média global, um terço das vítimas é constituído por crianças e adolescentes, que, nas nações de baixa renda, representam metade dos atingidos por esse hediondo crime.
Não há dúvida de que a infância e a juventude, principalmente em nações emergentes e pobres, encontram-se entre os segmentos demográficos mais prejudicados pela pandemia. O novo coronavírus deixa uma lição definitiva e incontestável: a educação, além de garantir a independência, consciência, prerrogativas da cidadania, inclusão e oportunidades de ascensão socioeconômica, é decisiva para a proteção, sociabilização e alimentação adequada de milhões de crianças, no Brasil e no mundo.
* Carlos Trindade é diretor pedagógico da Realvi English Immersion, Edtech especializada em ensino bilíngue
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