Problemas da vida real despertam o espírito empreendedor nos alunos da USP

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Da Redação – Uma solução mobile e web para que produtores rurais entrem em contato com profissionais de saúde animal como veterinários e zootecnistas a fim de agendar consultas, realizar consultorias e receber alerta da situação agropecuária na região. Essa foi uma das cinco propostas finalistas apresentadas na etapa regional da competição Ideas for Milk em São Carlos.

Chamado de Vet24hs, o projeto surgiu nas salas de aula do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos. Apesar de não ter sido classificado para a etapa final do desafio, o grupo que desenvolveu a ideia pretende dar continuidade à iniciativa.

“Foi uma experiência indescritível e totalmente diversa do que normalmente se faz em sala de aula. Precisamos unir nossa técnica com as necessidades do cliente e pesquisar sobre o agronegócio do leite, uma área sobre a qual não conhecíamos nada”, revela Lucas dos Santos, aluno do curso de Estatística do ICMC, um dos responsáveis pelo Vet24hs. “Foi um desafio que conciliou academia e mercado e fez a gente enxergar um universo amplo de aplicações tecnológicas no campo”, completa o estudante. Na opinião de Lucas, o Ideas for Milk possibilitou a aproximação de profissionais que não costumam dialogar: “Poucas pessoas que trabalham na área tecnológica se interessam pelos problemas enfrentados pelo homem do campo, bem como poucos que atuam no agronegócio se interessam pela tecnologia”.

O estudante explica que, inicialmente, o Vet24hs era apenas um projeto desenvolvido para a disciplina Empreendedorismo: “Mas a professora Simone Souza nos falou sobre a competição e nos incentivou a participar”. Lucas coordenou o desenvolvimento da proposta junto com a estudante Jéssika Darambaris, que estuda Engenharia de Computação – curso oferecido em parceira pelo ICMC e pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESC). “O Ideas for Milk me fez ter mais confiança em mim mesma e aprender a defender uma ideia como se fosse a melhor já inventada. Essa confiança e motivação contam muito na hora de conversar com os avaliadores ou futuros investidores”, conta Jéssika. Também fizeram parte da equipe a gestora de recursos humanos Lígia Rissardi e mais três estudantes de Engenharia de Computação: Guilherme Bordignon, Lais Fortes e Yuri Robin.

Para a professora Simone, os jovens se empolgam quando conseguem vislumbrar a aplicação dos conceitos que estão aprendendo em sala de aula na solução de problemas da vida real. Divulgar as competições em que eles podem inscrever seus projetos é um estímulo adicional. “Ao participar dessas iniciativas, eles têm um amadurecimento, passam a enxergar qual caminho deve ser percorrido para que uma ideia inovadora, nascida dentro da Universidade, transforme-se em um produto e chegue ao mercado”, conta Simone.

Segundo Jéssika, as aulas de empreendedorismo foram fundamentais para definir o formato da proposta, já que, inicialmente, o grupo não tinha nenhuma experiência na elaboração de um modelo de negócio: “Não sabíamos responder perguntas básicas: como você vai ganhar dinheiro? De quem vai cobrar esse dinheiro? Por que as pessoas pagariam ou investiriam na sua ideia?”.

Durante as aulas, a estudante revela que houve várias apresentações e, a cada etapa, a professora Simone e os demais colegas de sala levantavam questões importantes para as equipes e faziam os grupos refletirem mais sobre o assunto e aprimorarem as propostas. “A ideia inicial foi apenas um embrião que foi se desenvolvendo ao longo da disciplina e chegou à forma que apresentamos para a Embrapa.” Na final local realizada em São Carlos dia 28 de novembro, durante os 15 minutos em que os avaliadores questionaram o grupo, não houve nenhum imprevisto porque todas as perguntas já haviam sido respondidas em sala de aula. “Acredito que o maior aprendizado foi: não basta ter uma ideia boa, ela precisa ser bem desenvolvida, é necessário estudar o mercado”, completa Jéssika.

Aproximando academia e indústria – O ICMC foi uma das instituições correalizadoras do Ideas for Milk em São Carlos e o responsável por articular a parceria com a Embrapa foi o professor José Carlos Maldonado. “No ICMC, temos visto várias iniciativas, algumas delas no âmbito de disciplinas e outras no âmbito de projetos em rede, com o intuito de trazer os problemas e demandas sociais para dentro da Universidade, procurando estabelecer redes de colaboração entre a academia e a indústria, ou com o próprio governo”, ressalta o professor.

Na opinião de Maldonado, o aluno, enquanto cidadão, deve desenvolver, na Universidade e em sua vida profissional, um conhecimento mais amplo sobre os problemas e demandas sociais nos mais diversos domínios de aplicação: “Esse conhecimento pode motivá-lo a desenvolver habilidades e competências na busca de soluções para esses problemas e demandas”.

Considerando-se as oito cidades-sede que realizaram o Ideas for Milk (São Carlos, Belo Horizonte, Campinas, Juiz de Fora, Lavras, Piracicaba, Porto Alegre e Viçosa), 131 propostas foram submetidas e São Carlos foi a que recebeu o maior número de projetos, 29 no total. “São Carlos e região constituem um solo rico na formação de profissionais de altíssima qualidade na área de tecnologia da informação e comunicação. Esse cenário leva, certamente, à proposição de diversas e inúmeras soluções, assim como propiciará altos investimentos, num futuro próximo, constituindo um ecossistema de inovação e empreendedorismo fértil, cenário que hoje em dia já se delineia”, esclarece Maldonado.

A final nacional do Ideas for Milk aconteceu dia 13 de dezembro, em Brasília. A equipe SCL Rota – Sistema de Coleta de Leite, finalista de Belo Horizonte, ficou em primeiro lugar ao propor uma plataforma que acompanha e gerencia a rota do leite desde o produtor até a indústria. “O papel das universidades foi importantíssimo em unir a turma da tecnologia da informação com a das ciências agrárias. Estamos deixando um caminho sólido para que outros segmentos do agronegócio possam repetir essa experiência de acordo com suas particularidades”, diz o chefe-geral da Embrapa Gado de Leite, Paulo Martins Paulo Martins.

Be an Icon – Outro estudante de Engenharia de Computação do ICMC que só ingressou em uma competição por causa das aulas de empreendedorismo foi Rafael Farah. O projeto que ele desenvolveu, SmartGuide, um guia automático destinado a auxiliar pessoas com deficiência visual a terem uma experiência mais completa em ambientes culturais, como museus e exposições, ficou entre os finalistas no concurso Be an Icon. Realizado pelo Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria, sediado no ICMC, em parceria com a empresa Siena Idea, o concurso tem como objetivo promover aplicações para a tecnologia dos beacons, pequenos dispositivos físicos que emitem curtos pacotes de dados bluetooth com certa frequência e raio de alcance programáveis.

“As aulas de empreendedorismo foram de grande importância. Eu só fiquei sabendo do concurso por causa disso e precisei desenvolver um modelo de negócio em Canvas, tópico que a professora Simone ensinou em sala”, conta Rafael. Ele explica que a ideia de desenvolver uma solução voltada a pessoas com deficiência visual surgiu por ele acreditar que todos devem ter acesso a atividades culturais: “Embora esse acesso seja único para cada pessoa, ele não pode ser negligenciado a certa parcela da população. A ideia do SmartGuide é justamente essa: proporcionar uma experiência mais completa, de modo que todos possam aproveitar a ida ao museu ou a exposições de arte”.

Agora, Rafael está trabalhando no desenvolvimento do aplicativo e estudando como realizar a comunicação com os beacons físicos. Ele e os demais responsáveis pelos cinco projetos classificados para a segunda fase do concurso têm até o dia 24 de fevereiro para entregarem as propostas detalhadas de seus projetos. “A utilização de beacons para sinalização de itens de acervo em museus, de produtos para venda e em guias eletrônicas para turismo é bem conhecida. Pretende-se, com esse concurso, expandir o universo de utilização desses dispositivos dentro do que se convencionou chamar de Internet das Coisas”, explica Edson Moreira, professor do ICMC e um dos coordenadores do concurso.

Edson é um dos pioneiros do Instituto na apresentação de problemas reais aos alunos em sala de aula, estimulando-os a propor soluções para empresas. Há seis anos o professor inclui a demonstração do protótipo de um produto e a construção de um plano de negócio na avaliação de uma das disciplinas que ministra no ICMC, Tópicos Avançados em Comunicação. “O aluno tem que demonstrar que entendeu a teoria e que conseguiu transformar essa teoria em um produto vendável, com clientes, com mercado, com a ideia da cadeia de custos e tudo mais”, conta o professor.

Chamada de Projeto como Produto, a iniciativa de Edson prevê uma feira de problemas no início do processo, quando os alunos entram em contato com desafios propostos por diversas empresas. Durante o semestre, os estudantes têm várias reuniões para avaliar o andamento do estudo do problema e, no fim da disciplina, participam de uma feira de produtos, na qual apresentam as soluções que desenvolveram. Na edição de 2016 da feira de produtos, realizada dia 9 de dezembro, 14 equipes apresentaram seus projetos no saguão da Biblioteca Achille Bassi.

Muitas dessas ideias que surgem nas salas de aula do ICMC servirão de embrião para futuros aplicativos, serviços, produtos e startups. A equipe de Jéssika e Lucas, por exemplo, pretende amadurecer mais a proposta do Vet24hs, incorporar as várias dicas recebidas dos especialistas do Ideas for Milk e dar continuidade à proposta. “Termos chegado à final local da competição já foi uma vitória”, diz Lucas. “Essa experiência acendeu uma faísca na gente. Quero seguir na linha do empreendedorismo”, finaliza o estudante.

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