Para especialistas, a universalização pode ser alcançada se a Lei Nacional de Saneamento, de 2007, for totalmente implementada
Da Redação – O PL 4.162/2019, que tramita no Senado, entre outras medidas acaba com a cooperação entre entes federados nos serviços de água e esgoto. O projeto, que prevê maior participação da iniciativa privada no saneamento, na prática fará com que municípios mais pobres sejam excluídos do acesso aos serviços.
De acordo com Marcos Montenegro, coordenador geral do ONDAS (Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento), hoje, por meio do subsídio cruzado, os municípios superavitários garantem o saneamento naqueles que são deficitários. “Se o PL for aprovado, essas cidades mais pobres, que não são atraentes para as empresas de saneamento, terão que operar com recursos próprios. E sabemos que isso é impossível em muitos casos”, afirma Montenegro.
O projeto de lei ainda coloca o Brasil na contramão do mundo. Segundo estudo realizado pelo Instituto Transnacional, com sede na Holanda, 884 municípios, em mais de 35 países, reestatizaram seus serviços de 2000 a 2017. A razão, na maioria das vezes, foram as tarifas altas e a baixa qualidade.
O ex-secretário nacional de Saneamento e membro do Conselho de Orientação do ONDAS, Abelardo de Oliveira Filho, alerta que a experiência também mostra que a privatização não garante mais investimentos para o setor de saneamento. “Um exemplo disso é Manaus, onde o saneamento é privatizado há 20 anos e conta com mais de 600 mil pessoas sem água e apenas 12,5% da população com acesso ao esgotamento sanitário. Aliás, o Banco Mundial, incentivador das privatizações no anos 90, já fez ‘mea culpa’, porque nunca houve aporte de recursos privados no saneamento. O dinheiro sempre foi do setor público”, destaca
Segundo Abelardo, para garantir a universalização do saneamento há necessidade de que a Lei Nacional do Saneamento (11.445/2007) seja totalmente implementada. “Só assim será garantido o acesso à água de qualidade para todos, além de garantir recursos financeiros permanentes para se investir no setor de saneamento. Para isso, no entanto, uma das necessidades é a revogação da EC 95”, afirma o ex-secretário.
Manifesto
O ONDAS, juntamente com dezenas de outras entidades, divulgou um documento dirigido aos senadores, no qual manifesta que “a garantia do acesso aos serviços de saneamento básico para toda a população, inclusive aquela que não tem condições de pagar, não pode ser submetida aos interesses privados, onde o lucro vem em primeiríssimo lugar. O saneamento não pode prescindir de uma forte atuação dos operadores públicos estaduais e municipais”.
Ao final, os signatários fazem um apelo “para que não permitam, que o PL 4.162, de 2019, seja apreciado, sobretudo num momento de pandemia da COVID-19 e de crise social, política e econômica que se abate sobre o povo brasileiro”. Clique aqui para ler o manifesto na íntegra.
O ONDAS nasceu com o propósito de promover a ação conjunta, autônoma e crítica de instituições acadêmicas e de movimentos sindicais e sociais de todo o país, assegurando, dessa forma, a efetivação ao direito universal ao saneamento, por meio da gestão pública e democrática.
O Observatório trabalha na perspectiva de que, a partir da produção e disseminação de dados, análises e estudos críticos, é possível enfrentar, de modo mais efetivo, o processo de mercantilização da água e de privatização do saneamento, que tende a dificultar o acesso ao serviço, principalmente por parte da população mais pobre.
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