O velho problema da licitação constrange alunos paulistanos

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* Rubens F. Passos – É lamentável o atraso no fornecimento de uniformes e materiais escolares para os alunos da rede municipal de ensino de São Paulo, neste início do ano letivo de 2017. O motivo é o de sempre: problemas no processo de licitação, que vêm se repetindo há anos no Brasil, tanto nas concorrências feitas por governos estaduais, como prefeituras. Trata-se de velha e conhecida distorção, cujos principais prejudicados são os alunos.

No presente caso das escolas paulistanas, são 600 mil estudantes que não receberam os seus uniformes e 970 mil que estão frequentando as aulas sem cadernos, lápis, canetas, réguas, borrachas, compassos, fichários, agendas e outros itens importantes para o aprendizado. Acentuam-se, como consequências de falhas como essa, as assimetrias entre o ensino particular e o público, que contrariam o princípio democrático da igualdade de oportunidades.

O mais grave de tudo isso é que o problema não é novo, repetindo-se a cada gestão. Há dez anos, a imprensa já mostrava os alunos da cidade de São Paulo indo às aulas sem uniforme. Entra prefeito, sai prefeito e nada se resolve. Importante lembrar, ainda, o prejuízo de R$ 42,5 milhões identificado pela CGM (Controladoria Geral do Município) nos contratos para fornecimento de material escolar e uniformes pela Secretaria da Educação do Município de São Paulo, conforme investigação feita em 2016. Os contratos, avaliados desde 2013, têm indícios de direcionamento e falta de competitividade.

É absurdo que se insista num erro grave, quando há solução eficaz para o problema, aprovada na prática no tocante às compras de cadernos, fichários, lápis, canetas, mochilas, réguas, compassos e outros produtos: o Cartão Material Escolar, já adotado com sucesso em várias cidades do Estado de São Paulo, no Distrito Federal e em todo o Estado do Maranhão.

Em vez das desgastadas licitações, cada aluno recebe um cartão com o valor correspondente à variedade e quantidade de material a ser adquirido para a série que irá cursar. Com isso, a compra é efetuada em estabelecimentos comerciais da cidade ou região em que o estudante mora. O modelo, além de evitar atrasos, impede a corrupção, pois não há como fraudar um sistema desse tipo.

O Cartão Material Escolar também revitaliza as pequenas e médias papelarias, excluídas do grande mercado representado pelas compras governamentais. Assim, incentiva o comércio local, contribuindo para a geração de empregos e a economia de cada cidade.

Quanto aos alunos, principal foco de toda a estrutura educacional, o modelo promove a cidadania, pois lhes permite comprar e escolher de modo personalizado os seus materiais. Reforça a identidade e a individualidade de cada criança ou jovem, oferecendo-lhe o poder de decisão, que deixa de ser um privilégio dos filhos de famílias de maior poder aquisitivo.

Contudo, os quase um milhão de estudantes paulistanos sem material e uniforme estão pagando o preço de um equívoco recorrente há anos. Enquanto tratar o ensino com descaso, o Brasil terá dificuldade para conquistar o desenvolvimento e ter uma economia realmente competitiva, num mundo onde o maior diferencial das nações é sua capacidade para formar profissionais e cientistas eficientes em todas as áreas do conhecimento.

* Rubens F. Passos, economista pela FAAP e MBA pela Duke University, é presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes e Importadores de Artigos Escolares e de Escritório (ABFIAE) e presidente do Conselho da Enactus Brasil

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1 comentário on "O velho problema da licitação constrange alunos paulistanos"

  1. Regina Ribeiro

    Criada há 24 anos, a chamada Lei de Licitações e Contratos (8666/93) se tornou, ao longo desse período, uma porta de entrada pela qual passam, de mãos dadas, empresários e agentes públicos na trilha da corrupção. Essa lei é extremamente complexa, ritualista. Em função disso, se tem uma série de atos que acabam tornando essas contratações ineficientes e com desvio de finalidade.

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