- Paulo Niccoli Ramirez
Em entrevista concedida ao Jornal Nacional, no dia 22 de agosto, o candidato à reeleição Jair Bolsonaro expressou sua dupla face. Aos eleitores que se opõem ao seu governo apresentou uma série de versões falsas sobre ausência de corrupção na atual administração do Estado, defendeu o tratamento precoce, comprovadamente ineficaz, contra a Covid e elogiou seu mandato pelo suposto dinamismo na compra de vacinas, desdenhando sua gravidade.
Negou que tenha xingado ministros do Supremo Tribunal Federal e Tribunal Superior Eleitoral (negligenciando vídeos que comprovam suas mentiras). Afirmou seu compromisso com o meio ambiente, na verdade inexistente, e com os resultados das eleições, desde que sejam limpas, segundo seus próprios critérios. Por outro lado, aos seus apoiadores, Bolsonaro apresentou um discurso que trouxe conforto e visão otimista de um governo preocupado com a população e a economia.
No entanto, as falas do atual presidente não condizem com a realidade do país e de sua personalidade. Nos últimos quatro anos, a sociedade brasileira esteve diante de uma grave crise econômica, ambiental, sanitária e expansão do discurso de ódio.
Apesar de ter afirmado sua habilidade em negociar fertilizantes com os russos, em meio ao conflito armado com a Ucrânia em nome da segurança alimentar do Brasil e do mundo, não mencionou o fato de que o Brasil hoje sofre com a crise alimentar de mais de 33 milhões de brasileiros. Outro aspecto destacável deveu-se quando foi questionado sobre sua relação com o Centrão, que havia criticado severamente nas eleições de 2018. O candidato mencionou que o jornalista William Bonner o estava estimulando a ser um ditador, sendo preferível governar com o congresso e com o Centrão.
Aliada às sucessivas críticas às urnas eletrônicas, a menção a um suposto estímulo a ser um ditador revela os próximos capítulos que estão por vir no atual processo eleitoral. Devemos questionar se Bolsonaro conseguirá mobilizar no feriado de 7 de setembro seus apoiadores às ruas em nome da manutenção de seu governo pela via autoritária e antidemocrática.
Diante de uma virtual derrota, conforme apontam as pesquisas de intenção de voto, o questionamento que deve ser elaborado é como Jair e os bolsonaristas irão reagir aos resultados.
- Paulo Niccoli Ramirez é professor da ESPM, da Casa do Saber e da Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Autor dos livros “Sérgio Buarque e a Dialética da Cordialidade” (EDUC, 2011) e “Ética, cidadania e sustentabilidade” (SENAC, 2021).
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