Diretriz de proteção integral determinada pelo Estatuto representa importante elo entre a Constituição Federal (1988) e a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, da Organização das Nações Unidas
Da Redação – O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990) completa 32 anos no próximo dia 13. A data precisa ser celebrada ano a ano, especialmente considerando os diversos retrocessos, em vários campos, que têm marcado o Brasil sob a atual gestão presidencial.
A sua força está em ter promovido uma radical alteração na concepção a respeito da infância e adolescência e seus direitos, a quem cabe responsabilizar-se sobre elas e o papel do Estado saindo do lugar de repressão para o de formulador de políticas públicas que as proteja, ao lado de outros atores.
Em linhas gerais, são três os aspectos estruturantes do ECA: 1) está posto que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos (que devem ser cumpridos!), 2) estão numa condição peculiar de desenvolvimento e 3) devem ser consideradas como pessoas com prioridade absoluta nas políticas sociais, sem distinção alguma.
Temos, portanto, há mais de três décadas um ordenamento jurídico completo que promove, defende e garante os direitos das crianças e dos adolescentes. O artigo 4º, por exemplo, é categórico ao afirmar que ”É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde…”
O atual ambiente social e político é bastante preocupante e está marcado pelo desmantelamento de políticas sociais, seja pela fragilização de Conselhos (como tentou-se com o Conanda – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), extinção deles (como aconteceu com o Consea – Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional, assim que Jair Bolsonaro assumiu, ainda em janeiro em 2019), seja por cortes orçamentários e fim de programas, entre outras ações. Em campanha eleitoral, em 2018, numa cidade do interior paulista, o então presidenciável, disse textualmente: “O ECA tem que ser rasgado e jogado na latrina. É um estímulo à vagabundagem e à malandragem infantil”.
O nascimento do ECA e a indissociabilidade de direitos
Sabemos todos da importância da ECA, da sua potência e do momento em que foi formulado, pleiteado e lançado, no final dos anos 80. A sociedade civil brasileira estava em ebulição e finalmente vivendo os primeiros sabores do fim da ditadura militar. Era a volta da democracia e a esperança da escuta e validação de vozes que protegiam e olhavam pelos mais vulneráveis. Havia a esperança da coesão em busca de um Brasil melhor e menos desigual, sem censura, com voto.
Entre os artigos, capítulos e títulos que compõem o Estatuto, diversas esferas da vida das crianças e adolescentes estão contempladas, como o “Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer” (Cap. IV). A pandemia agravou ainda mais a situação de pobreza, insegurança alimentar, trabalhos precarizados e a renda familiar dos brasileiros mais vulneráveis. A violação de direitos se somou ao longo dos últimos quase 30 meses: muitas famílias foram para a rua; o índice de evasão escolar aumentou, assim como o número de crianças e adolescentes que passaram a trabalhar. Antes dos 14, no entanto, o trabalho é permitido apenas na condição de aprendiz. Segundo pesquisa apresentada em junho pela Fundação Abrinq, o número de adolescentes entre 14 e 17 anos em situação de trabalho infantil, no quarto trimestre de 2021, era de 1,3 milhão (um aumento de 75.192 pessoas nessa condição, quando os dados são comparados ao mesmo período de 2019).
Sobre o vínculo escolar, a Unicef elaborou um estudo e apresentou os seguintes dados, em 2021, referentes ao ano anterior: “Em novembro de 2020, portanto ao final do ano letivo, 5.075.294 crianças e adolescentes de 6 a 17 anos estavam fora da escola ou sem atividades escolares, o que corresponde a 13,9% dessa parcela da população em todo o Brasil”.
Nunca foi tão importante celebrar e fazer valer o Estatuto da Criança e do Adolescente. A escola é um equipamento público extremamente capilarizado territorialmente. É mais que um espaço físico que reúne docentes e alunos: é lugar de troca, convívio e muitas vezes, detecção de violência em casa. Não é ao acaso que está no ECA.
A Lei diz exatamente o seguinte, em seu capítulo IV, Artigo 53: A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:
I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II – direito de ser respeitado por seus educadores; III – direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores; IV – direito de organização e participação em entidades estudantis; V – acesso à escola pública e gratuita, próxima de sua residência, garantindo-se vagas no mesmo estabelecimento a irmãos que frequentem a mesma etapa ou ciclo de ensino da educação básica.
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