O Ano Novo e as velhas práticas

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 * Dojival Vieira – O ano de 2012 chegou e chegou sem novidades no que diz respeito a postura da ministra chefe da SEPPIR, socióloga Luiza Bairros, cuja substituição é dada como certa na reforma ministerial que a Presidente Dilma Rousseff deve promover no final deste mês ou até meados do próximo, no mais tardar.

Do alto de uma arrogância já demonstrada e conhecida – e também já denunciada por nós – a ministra resolveu fazer um balanço do primeiro ano de sua gestão e escolheu apenas um veículo, ignorando os pedidos de entrevista que esta Afropress vem fazendo desde setembro, quando ela deixou nosso correspondente em Nova York, Edson Cadette, esperando duas horas no Waldorf Astoria, sem sequer uma palavra de satisfação, isso depois de sua assessoria ter confirmado a entrevista.

Não satisfeita, ao invés de um pedido de desculpas e a marcação da entrevista (fosse com o próprio correspondente ou no Brasil), a ministra chefe promoveu um espetáculo de autoritarismo sem paralelo no Estado Democrático de Direito, ao pretender “enquadrar” a Afropress, arrogando-se no papel de especialista em uma área, que não conhece, nem domina: o jornalismo.

Antes mesmo do episódio lamentável – denunciado por nós com a mesma firmeza com que temos nos confrontado com os que pretendem, sem autoridade nem legitimidade, nos pautar – a ministra já havia demonstrado o desapreço, a falta de respeito e o despreparo para lidar com órgãos de informação na Democracia, ao pretender desmentir reportagem postada por nós e também publicada no Jornal Folha de S. Paulo, dando conta de sua eminente substituição, por causa do fraco desempenho.

Muito provavelmente dando ouvidos ao seu principal conselheiro – o assessor especial Edson Cardoso, notório pela idiossincrasia com que trata as pessoas que não comungam de suas idéias -, mandou sua assessoria fazer uma Nota de desmentido a matéria de Afropress, se referindo ao que noticiara a Folha e estranhamente dirigida ao Portal Áfricas, que apenas se encarregara de reproduzir a matéria.

Demonstração maior de má vontade e tratamento discriminatório, por quem deveria ser a primeira levantar a voz contra qualquer tipo de discriminação (até porque, certamente, já a terá sofrido na pele em circunstâncias diversas) não poderia haver.

Mas, não ficaria nisso. A ministra fecharia 2011 com chave de ouro, mais uma vez ignorando os nossos pedidos de entrevista desde setembro, escolhendo um único veículo para fazer um balanço do seu primeiro ano de gestão, óbviamente, pintando de cores favoráveis, no seu estilo acadêmico/epistolar, feitos e ações, que nós outros, na planície, não vimos.

Sem demérito ao trabalho jornalístico dos colegas do Portal Áfricas – com quem temos uma relação amigável e de parceria – a ministra nada disse de novo. Seu discurso não foi ouvido nem notado, inclusive, porque, um dia antes, analistas com trânsito no Planalto davam conta de que sua permanência no cargo é pouco provável, por conta do desempenho sofrível.

Além da ausência de ações substituídas por exercícios retóricos, e de uma gestão com níveis de aprovação abaixo da média, Bairros conseguiu a façanha de produzir um consenso raro no Movimento Negro brasileiro: se indispor com 90% dos segmentos mais representativos que atuam no seu próprio partido – o Partido dos Trabalhadores.

Com apoio das ONG’s a quem está ligada desde que deixou o Movimento Negro Unificado (MNU), em 1.994, simplesmente, ignorou o discurso de posse em que anunciava a disposição para dialogar com os diferentes segmentos, partidários ou não.

Esqueceu que, ocupante de cargo de ministro em um Governo (qualquer Governo) não pode prescindir da gestão política que, na prática, significa, está constantemente aberto ao diálogo, o respeito a quem pensa diferente, a disposição de contribuir para aglutinar e unir o amplo leque de forças comprometidas com o combate ao racismo e o aprofundamento da democracia.

Nada disso se fez, nem nada disso se viu. Ao contrário: instalou-se uma espécie de “diálogo de surdos” em que a ministra só ouve, só recebe, os membros do seu seleto grupo e amigos de longa data.

A SEPPIR tornou-se a pura expressão do grupo de ONG’s, que tem divergências históricas com parcelas expressivas das lideranças que atuam nos vários partidos da base do Governo, e isso gerou uma consequência óbvia: o Movimento Negro brasileiro nunca esteve tão fragilizado nos últimos 10 anos; perdeu espaço, inclusive, no Governo, e as nossas demandas deixaram de fazer parte da agenda política do país.

O maior exemplo dessa fragilidade é que, pela primeira vez desde 2003, não há nenhum ministro negro na Esplanada dos Ministérios e a presença da parcela de 50,7% da população brasileira preta e parda está reduzida a duas Secretárias: uma, a Secretaria das Relações Institucionais, cuja titular – Idely Salvatti -, nunca se soube que tenha assumido qualquer compromisso com reivindicações históricas da população negra brasileira; a outra, a própria SEPPIR, enfraquecida pela postura autoritária, isolacionista e sectária da ministra chefe.

Por tudo disso, a Presidente Dilma Rousseff receberá os aplausos de 90% das lideranças negras mais expressivas do Brasil se, na reforma ministerial, decidir trocar Luiza Bairros por alguém que, alie a necessária competência técnica, à capacidade política de instaurar o diálogo como norma, como prática saudável e necessária, com todos os que consideram a luta contra a discriminação e o racismo parte integrante da luta mais geral da sociedade brasileira por Igualdade, Justiça e Democracia.

A SEPPIR – como espaço conquistado pela população negra brasileira no âmbito de um Estado que sempre virou às costas às nossas reivindicações – precisa de uma gestão para todos (as) para não se transformar em um mero “puxadinho”, incapaz de vocalizar as demandas e transformá-las em políticas públicas transversais capazes de atender a expectativa dos 96 milhões de negros e negras brasileiras, que continuam ocupando os espaços da desvantagem e da sub-cidadania.

De discriminação e sectarismo, estamos fartos!

 

* Dojival Vieira é jornalista, advogado, poeta e presidente da ONG ABC Sem Racismo, além de Jornalista Responsável e Editor da Agência Afropress (www.afropress.com). Sugestões, criticas ou elogios: abcsemracismo@hotmail.com e dojivalvieira@hotmail.com ou pelo site www.afropress.com

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