Da Redação – ‘Cabaré Transpoético’ é um espetáculo musical-poético-dramático que nasce do cruzamento de linguagens. Atriz, poeta e compositora, Beatriz Azevedo desejava criar um cabaré com poemas, músicas, projeções e cenas teatrais. Reuniu algumas ideias e levou para o diretor Aderbal Freire-Filho, conhecido por seu trabalho em transpor romances à cena.
O resultado deste encontro poderá ser conferido a partir de 16 de maio, no Sesc Pompeia, quando Beatriz Azevedo e Lucélia Santos, atriz convidada para o projeto, subirão ao palco acompanhadas dos músicos Jorge Helder, Pedro Amparo e João Bittencourt. Além de canções autorais de Beatriz, a encenação reúne os poemas de seu novo livro, ‘Abracadabra’ (selo Demônio Negro). A produção de toda a empreitada é da Quintal Produções, de Verônica Prates e Valencia Losada.
“Estamos em um momento em que somos todos trans, nos valendo do poder transformista/transformador para enfrentar esse momento político de enorme retrocesso social, de ameaça às artes, à cultura, ao saber. Um momento em que poesia é trans, porque é também revolução. Ao mesmo tempo, nosso espetáculo é trans-teatral, trans-musical, trans-imagético, além de trans-poético”, analisa Aderbal.
O diretor tem em seu currículo alguns romances levados ao palco e que foram batizados de ‘romance-em-cena’, entre eles ‘A Mulher Carioca aos 22 anos’ (1990), ‘O que Diz Molero’ (2003) e ‘O Púcaro Búlgaro’ (2006). ‘Ele criou o romance-em-cena, a partir da literatura em prosa e das narrativas longas. Perguntei o que ele acharia de criarmos algo equivalente, mas agora a partir da Poesia, da linguagem concisa e fragmentada dos poemas?’, conta Beatriz.
Aderbal e Beatriz se conheceram nas gravações do antigo programa apresentado por ele na TV Brasil (Arte do Artista) e a ideia de trabalharem juntos surgiu naturalmente, após o diretor ler ‘Antropofagia Palimpsesto Selvagem’, elogiado trabalho de Beatriz sobre o Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade. Ao receber os poemas de ‘Abracadabra’ – que será lançado durante a temporada de São Paulo –, Aderbal entendeu que os textos pediam um diálogo e uma segunda voz feminina, quando Lucélia Santos foi convidada para a aventura.
A potência das duas mulheres em cena é elevada pelos poemas e canções que falam sobre e através do universo feminino. ‘Uma das letras diz que Deus é mulher e mulher é bruxa. Quero trazer este lugar de uma mulher bruxa e poderosa, que pode nos tirar deste buraco em que estamos. É uma utopia, mas uma forma de sobreviver a um estado de guerra sem esquecer do humor, da alegria e da subversão’, conta Beatriz, que gravou as músicas do espetáculo no álbum ‘A.G.O.R.A’, a ser lançado ainda neste ano pela gravadora Biscoito Fino.
Tempos de guerra: do Cabaret Voltaire ao Cabaré Transpoético
Aderbal ressalta que a escolha da estrutura de cabaré remete ao Cabaret Voltaire (1916), de Zurique (Suíça) responsável por acolher artistas de nacionalidades e linguagens distintas no meio da Primeira Guerra Mundial. Tal cenário se tornou o epicentro do movimento dadaísta e inspirou a concepção do ‘Cabaré Transpoético’:
“Assim como o Voltaire nasceu no meio de uma guerra, agora também é hora, vivemos no meio de muito ódio, execuções, elogio à tortura, vivemos, enfim, uma distopia. Mas não se trata de criar um movimento. Além dos dadaístas, nosso cabaré reúne os surrealistas e, claro, recebe o convite da Beatriz para a antropofagia”, resume o diretor.
Não à toa, uma das referências escolhidas para o cenário, assinado por Fernando Melo da Costa, foi a instalação surrealista Festin (1959), de Méret Oppenheim. A concepção visual se completa com uma série de projeções, a cargo do estúdio Radiográfico, em mais uma linguagem que vai se cruzar com os outros gêneros propostos pelo cabaré. Alguns convidados vão gravar participações em vídeo para exibição ao longo da temporada.
Aderbal explica que uma das preocupações foi buscar um eixo narrativo dentro da suposta anarquia trazida pelo gênero e seu imaginário. Os textos e canções foram agrupados em sete blocos temáticos em uma estrutura que pode até remeter ao brasileiríssimo Teatro de Revista. ‘Beatriz anunciava o seu livro como o ‘roteiro de preparação de um banquete’. Este Cabaré começa com a devoração do banquete preparado, que é, ao mesmo tempo, a devoração antropófaga de uma morte por suicídio coletivo, para criar a festança da Revolução Caraíba. Uma manifestança no meio da zona’, celebra o diretor.
Serviço – Cabaré Transpoético, no Sesc Pompeia (Rua Clélia, 93), com Beatriz Azevedo e Lucélia Santos, de 16 a 26 de maio, às quintas, sextas e sábado, às 21h, e domingo às 18h. Ingressos: R$7,5 (credencial plena/trabalhador no comércio e serviços matriculado no Sesc e dependentes), R$12,5 (pessoas com +60 anos, estudantes e professores da rede pública de ensino) e R$25 (inteira). Em 18 e 19/05 apresentações gratuitas por conta da programação da Virada Cultural 2019.
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