* Carlos Lima – Causando diversas perdas em todos os âmbitos, a pandemia também impactou o setor de bebidas destiladas no Brasil. E só fez agravar – e muito – o que já era crítico.
A crise econômica oriunda da COVID-19 se soma à tributação elevada e desproporcional imposta ao segmento desde 2015 e ao crescimento do mercado ilegal de bebidas alcoólicas no país. Diante de tal conjuntura, não se imagina que a saída seja a criação de impostos com aumento de carga dentro da Reforma Tributária, como vem sendo discutido.
Seremos severamente impactados e os danos vão permear muitos setores da sociedade. Somente neste ano a previsão é uma queda de 22,9% nas vendas de destilados, segundo dados da Euromonitor International.
A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) indica uma queda de 80% nas vendas e no faturamento de bares e restaurantes – onde ocorre mais de 60% do consumo de bebidas alcoólicas. Mais de 20% desses estabelecimentos fecharam definitivamente e o segmento estima mais de um milhão de demissões.
Nosso setor atuou para conter os efeitos da crise em toda sua cadeia e ainda apoiar o governo e a sociedade. Os fabricantes produziram/envasaram mais de 200 mil litros de álcool 70%, doados às Secretarias de Saúde e instituições. As principais marcas assumiram ainda o compromisso de apoiar bares e restaurantes, disponibilizando, até o momento, cerca de R$ 14 milhões a esses estabelecimentos no Brasil
Ainda em consequência da pandemia, o setor viu sua produção despencar 59,1% em abril, em relação ao mesmo período do ano anterior, segundo dados do IBGE. Para se ter uma ideia da magnitude do impacto econômico, em pesquisa feita pelo IBRAC, mais de 65% dos participantes (empresas de Cachaça) tiveram uma redução de mais de 50% nas vendas.
A pandemia ressuscitou ainda a “Lei Seca”, com a proibição da comercialização e consumo de bebidas alcoólicas em vários municípios. Tal medida é repudiada por órgãos internacionais como a Tracit – Aliança Internacional de Combate ao Comércio Ilegal. Primeiro porque acaba estimulando a demanda por álcool ilícito.
E, segundo, porque traz riscos à saúde das pessoas, que acabam ingerindo bebidas sem qualquer controle, sobrecarregando o sistema de saúde que se pretendia desafogar. No México, por exemplo, 100 pessoas morreram em um intervalo de duas semanas por consumirem bebidas com álcool adulterado, em localidades em que a venda estava proibida.
Antes da crise da COVID-19, nosso setor tentava se recuperar do baque provocado pelas normas instituídas em 2015 no Brasil, que alteraram a sistemática de cobrança e estipularam alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para os destilados entre 25 e 30%, enquanto reduziram a da cerveja de 15% para 6%. Essa medida teve um impacto desastroso para os destilados.
A Cachaça, que representa 70% deste mercado, sofreu reajustes de mais de 200% apenas no valor do IPI pago por alguns produtos, em função das mudanças. Se por um lado o Governo pretendia ampliar a arrecadação com o aumento do IPI para destilados, por outro, ele abriu mão de receita ao ter reduzido o IPI da cerveja para 6%.
Em paralelo, o crime organizado lucra mais de R$ 3 bilhões anualmente com a comercialização de bebidas ilegais, que chegam a ser até 70% mais baratas do que as bebidas destiladas legais. A evasão fiscal decorrente disso impôs uma perda de R$ 10 bilhões para os cofres do governo só em 2017. Por essas razões, a tributação dos destilados já está além do ponto ótimo da curva de Laffer – ou seja, o governo mais perde do que ganha ao praticar impostos tão altos.
Diante dessa conjuntura, não é justificável falar em aumento de impostos e nem mesmo na criação de novos mecanismos de tributação, como o Imposto Seletivo, que poderá representar aumento da atual e já elevada carga tributária imposta ao setor de bebidas destiladas. A verdade é que impostos desta natureza pouco impactam o consumo nocivo de álcool e, uma vez mais, acabam estimulando o mercado ilegal e o crime organizado, prejudicando a sociedade e a indústria legítima.
Acreditamos que a isonomia tributária e regulatória no setor de bebidas alcoólicas é o caminho. Um caminho que passa pela eliminação das assimetrias e a promoção de um ambiente competitivo saudável, menos oneroso e indutor do desenvolvimento, que gere empregos e renda, cruciais neste momento de recessão global, e desestimule o mercado ilícito, que está sempre à espreita das brechas abertas por políticas ineficientes. A hora é agora.
* Carlos Lima é diretor Executivo do Instituto Brasileiro da Cachaça (IBRAC) www.ibrac.net FONTE IBRAC – Instituto Brasileiro da Cachaça
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