Segundo delação premiada de executivos da Camargo Corrêa, acordo milionário foi assegurado mediante pagamento de propina
Da Redação – Um engenheiro contratado para o gerenciamento das obras da fábrica de medicamentos do governo do Estado em Américo Brasiliense (região de Araraquara) lançou novas suspeitas sobre a indenização de R$ 22 milhões paga pela Furp (Fundação para o Remédio Popular) ao consórcio liderado pelo grupo Camargo Corrêa. A operação é alvo de delação premiada no Ministério Público e investigada por uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) na Assembleia Legislativa.
Segundo o engenheiro, eventuais prejuízos acumulados pelas empreiteiras não foram causados pela fundação, e sim pelas próprias construtoras.
O contrato entre a Furp e o consórcio foi assinado em 2005, com custo inicial de R$ 124,5 milhões. A fábrica acabou inaugurada em 2009, após R$ 31 milhões em aditivos. Ainda assim, três anos mais tarde, as empreiteiras conseguiram da Furp uma indenização de R$ 22 milhões por supostos prejuízos durante a construção – acordo que, segundo delação de executivos da Camargo Corrêa, foi assegurado mediante pagamento de propina a agentes públicos do Estado.
“A obra não parou. No entanto, ela não teve o andamento previsto em alguns momentos. Basicamente, por culpa do consórcio”, disse o engenheiro Marco Antonio Peixoto, que atuou no gerenciamento da obra em nome do Instituto Uniemp, contratado pela Furp para a empreitada.
“A obra não ficou parada. Ela ficou em ritmo lento por causa de uma indefinição sobre equipamentos. Uma indefinição do próprio consórcio”, acrescentou.
“Esse atraso, de certa forma, gerou um prejuízo ao Estado. Se ele [consórcio] foi contratado para executar uma obra em um determinado prazo, deveria ter cumprido.”
Triangulação
As declarações foram dadas por Marco Antonio Peixoto à CPI do Remédio Popular, que o convocou na condição de testemunha.
Peixoto atuou no gerenciamento das obras da fábrica de Américo Brasiliense. Seu vínculo era com a empresa Ductor Implantação de Projetos, subcontratada pelo Instituto Uniemp – quem, de fato, detinha o contrato com a Furp para o serviço.
O engenheiro contou que seu papel era fiscalizar o andamento das obras, verificando se os trabalhos executados estavam em conformidade com as exigências do edital (em quantidade e qualidade). Disse ainda que, durante todo o contrato, prestava contas diretamente à Assessoria Técnica de Engenharia da Furp, comandada por Ricardo Luiz Mahfuz – um dos acusados de cobrar propina da Camargo Corrêa. “Nosso objetivo era concluir a obra. Se havia negociações paralelas, eu desconheço”, afirmou.
Parecer para a Furp
Durante o contrato, a Furp solicitou um parecer do Instituto Uniemp sobre o pedido de indenização formulado pelas empreiteiras. “O consórcio encaminhou seu pleito à Furp e ela nos repassou para que déssemos um parecer”, relatou Peixoto.
“A Furp nos encaminhou o documento em setembro de 2008. Eu fui o recebedor. Veio com uma carta assinada pelo senhor Ricardo Mahfuz”, contou. “Em abril de 2009, respondemos que não era cabível aquele pleito. Não nos termos que o consórcio pediu.”
Segundo o engenheiro, o parecer encaminhado ao Instituto Uniemp fazia uma série de ressalvas sobre as alegações das empreiteiras e recomendava que os cálculos fossem refeitos com novas bases. A nova conta, no entanto, não foi devolvida para análise da gerenciadora. “O processo nunca mais voltou para a gente”, disse Peixoto à CPI.
Novos elementos
Para o presidente da CPI, deputado estadual Edmir Chedid (DEM), disse que as declarações do engenheiro trazem novos elementos para a investigação.
“Todos os envolvidos no caso diziam que o pagamento [da indenização] era embasado por um parecer da empresa que fez o gerenciamento da obra. Hoje, descobrimos que aquele que coordenava o processo não concordou com os pedidos”, disse.
“E, o que é pior, fez uma série de recomendações para a revisão dos cálculos, mas não recebeu de volta o processo para avaliar se a nova conta estava correta. Se era condizente com o que havia sido verificado.”
O deputado solicitou ao engenheiro cópias integrais dos pareceres elaborados pela Ductor. “É um absurdo ouvirmos o que estamos ouvindo aqui. Fica claro que há, no mínimo, um desencontro entre quem fazia o gerenciamento da obra, e dizia que o valor não era devido, e quem pagava. Aí, aparecem dois delatores dizendo: ‘Tivemos que dar 20% de propina’.
Sobre a CPI da Furp
A CPI da Furp foi aberta pela Assembleia em abril com base em requerimento do deputado Edmir Chedid – que citava, entre outras denúncias, as suspeitas de pagamento de propina na obra de Américo Brasiliense.
A comissão tem até novembro para concluir seus trabalhos. Na próxima semana, os deputados se reúnem para nova rodada de depoimentos.
Nenhum comentário on "Fiscal de obra da Furp põe em xeque pagamento de indenização a empreiteiras"