A criminalização é o remédio para uma prática social doente?

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* Debora Regina – No último dia 12 de março foi aprovado na Câmara dos Deputados o projeto de lei que visa tipificar a prática de assédio moral no ambiente de trabalho como crime.

Segundo o projeto, quando alguém ofender reiteradamente a dignidade de outro, causando-lhe dano ou sofrimento físico ou mental no exercício de emprego, cargo ou função, poderá ser punido com pena de detenção de um a dois anos e multa.

Diante de tal aprovação, fica o questionamento: seria esse o melhor remédio?

Para chegarmos a uma resposta coerente, torna-se necessário analisarmos o contexto do ato que estamos tentando coibir e o resultado prático da proposta de meio a ser utilizado para tal coibição.

Quando falamos em contexto da prática do assédio moral, precisamos considerar que vivemos em uma sociedade capitalista, que visa o lucro, de modo que a competitividade é inerente a este modelo econômico-social. Por essa razão, no ambiente de trabalho, se prestigia a alta produtividade, o alcance de metas inatingíveis, a obrigatoriedade de inovação constante, a assiduidade e a devoção ao trabalho.

Então, quando o funcionário não de adapta a esse “padrão lucrativo”, surgem as cobranças em ordem decrescente dos níveis hierárquicos, até que chegue à pessoa responsável por fazer com que aquele funcionário atenda às expectativas da empresa. Eis que surge a questão, qual prática utilizar para adequar o funcionário a este “padrão lucrativo”?

E é neste momento que pessoas despreparadas ao invés de aplicarem práticas motivacionais, passam a ridicularizar aquele que não atinge a meta, desmoralizar perante os colegas aquele que falta com certa frequência, expor as falhas daquele profissional perante a sua equipe ou fomentar a discriminação daquele funcionário que prejudicou o rendimento de seu grupo de trabalho, atitudes estas que praticadas de forma reiterada são caracterizadas como assédio moral.

Diante desta contextualização é que passamos a questionar: punir o assediador, que nada mais é do que uma pessoa despreparada para cumprir essa tarefa de “padronizar” o funcionário, resolverá o problema da pratica do assédio moral no ambiente de trabalho? Parece que não, pois a estrutura empresarial da forma como se encontra, sempre produzirá novos assediadores.

Sendo assim, resta claro que a mudança tem de ocorrer nessa estrutura empresarial e para isso a Justiça do Trabalho já possui ferramentas, as quais precisam ser mais bem utilizadas e os órgãos melhor aparelhados. Pois no Direito do Trabalho existe a teoria da Culpa in Vigilando, a qual responsabiliza a empresa pelos danos que forem causados em razão de sua ausência de fiscalização, pois cabe a empresa a obrigação de vigiar os atos de seus funcionários.

Desta forma, se está ocorrendo uma situação de assédio moral dentro de uma empresa, de quem é a responsabilidade de tomar conhecimento de que isto está ocorrendo e punir o assediador? De quem é a obrigação de criar meios de prevenção à ocorrência do assédio e de combate a tal prática? Se está ocorrendo, quem está faltando como seu dever de vigilância? A resposta para todas essas perguntas é a mesma, a empresa.

Sendo assim, qual o resultado prático de criminalizar o ato do assediador se o fato gerador do assédio moral é estrutural? E quando pensamos em resultado prático e olhamos para o projeto de lei que prevê pena de detenção de até dois anos, que pode ser transacionada por uma pena alternativa como prestação de serviços à comunidade ou pagamento de determinado valor para instituição de caridade, concluímos que não há resultado prático algum, pois nem mesmo “amedrontadora” na tentativa de coibir efetivamente tal ato, esta tipificação criminal não será.

De modo que a resposta é não, certamente este projeto de lei não é o remédio adequado para curar esta prática doente, pois tal prática não será sanada com uma providência pontual, é necessário um tratamento mais abrangente que busque através das ferramentas já disponíveis no próprio Direito do Trabalho a sua solução.

Aumentando a atuação do Ministério Público do Trabalho e dos Sindicatos das categorias, no sentido de conscientizar e exigir das empresas um comprometimento maior com a saúde e dignidade de seus funcionários, fiscalizando e prevenindo de forma eficaz a prática de assédio moral dentro de suas organizações, visto que este é um dever do empregador previsto no art.157 da CLT desde 1977.

* Debora Regina Ferreira da Silva é advogada e sócia do escritório Akiyama Advogados Associados. Possui pós-graduação em Processo Civil e do Trabalho na Escola Paulista de Direito – EPD, concluída em 2016

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