Da Redação – Em certo sentido, o macaco-de-cheiro-da-cabeça-preta (Saimiri vanzolinii) pode ser considerado uma espécie de sorte: afinal, vive nas áreas protegidas da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, onde está a salvo de vários perigos que ameaçam outros primatas amazônicos, como a caça descontrolada e o desmatamento. Por outro lado, uma característica que torna esta espécie vulnerável é sua distribuição geográfica extremamente restrita.
De todas as espécies de primatas das Américas, o macaco-de-cheiro-da-cabeça-preta – que se diferencia dos outros macacos-de-cheiro pela pelagem escura na cabeça, como o nome sugere, e nas costas – é a que tem a menor distribuição. A população inteira de S. vanzolinii, estimada em cerca de 150 mil exemplares, vive em 870 quilômetros quadrados, na região sul da Reserva Mamirauá e em duas ilhas adjacentes à área de preservação.
Segundo a primatóloga Fernanda Paim, do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, que estuda a espécie desde 2006, embora os dados mostrem que a população de macacos-de-cheiro-da-cabeça-preta vem se mantendo estável, é muito preocupante que ela esteja concentrada em uma área tão pequena. Com uma possível redução de habitat no futuro e o risco de hibridização com outros macacos do mesmo gênero, a espécie corre o risco de desaparecer. “S. vanzolinii está listado como vulnerável à extinção nos âmbitos nacional e global”, alerta a pesquisadora.
Diferentemente do que acontece com outras espécies amazônicas, o que ameaça o habitat do macaco-de-cheiro-da-cabeça-preta não é o desmatamento, mas um fenômeno mais difícil de se controlar no âmbito local: as mudanças climáticas. Como o primata vive em áreas de várzea, isto é, em áreas que passam alagadas vários meses por ano, sofreria muito com o impacto de alterações na dinâmica das chuvas.
Com a previsão de que, nos próximos 100 anos, a temperatura do planeta pode estar cerca de 4 graus Celsius mais quente, é provável que as chuvas e alagamentos se tornem mais intensos e mais frequentes, o que vai ter impacto direto sobre as diversas espécies animais que habitam a várzea, incluindo S. vanzolinii. Se a espécie não for capaz de se adaptar a essas novas condições, pode acabar extinta.
Para evitar que isso aconteça, Paim e sua equipe estão trabalhando em um projeto ambicioso. Os cientistas vêm coletando e armazenando material reprodutivo – em particular, amostras de sêmen – dos macacos-de-cheiro-da-cabeça-preta. Em breve, planejam fazer o mesmo com óvulos, um material cuja extração é ainda mais delicada. A ideia é, caso seja necessário no futuro, ter a possibilidade de realizar reprodução assistida dos macacos, recuperando a população.
O macaco-de-cheiro-da-cabeça-preta – Saimiri vanzolinii foi descrito em 1985 pelo primatólogo José Márcio Ayres, um dos principais articuladores da criação da Reserva Mamirauá – o nome específico, vanzolinii, foi uma homenagem a seu orientador, o biólogo Paulo Vanzolini. Porém, a espécie não voltou a ser tema de estudos científicos até 2006, quando Paim iniciou sua pesquisa.
O macaco-de-cheiro-da-cabeça-preta vive em grupos de até 50 indivíduos, muitos dos quais aparentados, e passa a maior parte de seu tempo se deslocando em busca de alimento – sua dieta inclui frutos como apuí e taperebá, além de aranhas e insetos, como gafanhotos. Quando não estão se deslocando, os macacos desta espécie passam o tempo dormindo por curtos períodos de tempo ou fazendo atividades sociais, como brincadeiras, comuns entre os filhotes, ou brigas.
No período reprodutivo, que vai de setembro a outubro, durante a época seca, os machos engordam para atrair a atenção das fêmeas. A gestação, geralmente de um filhote apenas, dura seis meses. Depois do nascimento, o filhote permanece junto à mãe por cerca de dois anos, quando começa a buscar seu próprio alimento. Quando isso acontece, a fêmea está pronta para acasalar novamente.
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