A violência contra a mulher vista sob um viés econômico

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* Mariana da Cruz Mascarenhas – Na história das sociedades houve diferentes e diversas formas de violência contra a mulher: submissão doméstica, escravidão sexual, acusação de bruxaria, inquisição, assédio sexual e moral, condenação à forca e à fogueira, entre outras.

Mas, em pleno século XXI, muitas ainda persistem. O Brasil é o quinto país no ranking de violência contra a mulher de acordo com o Mapa da Violência de 2015. A cada 11 minutos uma mulher é estuprada e a cada uma hora e meia, outra é morta, vítima de feminicídio – homicídio de mulheres por razões da condição de sexo feminino.

Dados do Instituto Datafolha complementam este cenário: uma pesquisa feita em 2016 no Brasil revelou que, a cada hora, 503 mulheres foram vítimas de agressão física, totalizando 4,4 milhões ao ano. Vinte e nove por cento das entrevistadas relataram ter sofrido alguma agressão nos últimos 12 meses e, dentre elas, 61% de seus agressores eram conhecidos.

Deste público, apenas 11% procuraram uma delegacia da mulher, 13% procuraram ajuda da família e 52% não fizeram nada. A inação de muitas vítimas decorre, na maioria das vezes, por medo, vergonha ou até mesmo por receio de perder o sustento garantido pelo agressor, embora a participação feminina no mercado de trabalho tenha crescido cada vez mais.

Porém, há uma desproporcionalidade ainda pouco estudada, que é justamente o impacto de fatores como a violência doméstica no desempenho profissional da vítima e no mercado de trabalho. Pois, à medida que os casos de agressão aumentam, decresce o rendimento de muitas vítimas em seus cargos profissionais.

Um estudo apresentado pela Universidade Federal do Ceará (UFC) em agosto de 2017 constatou que a economia do Brasil perde aproximadamente R$ 1 bilhão devido às consequências da agressão sofrida por trabalhadoras em seus lares. A pesquisa acompanhou dez mil mulheres em nove capitais nordestinas desde 2016 como parte do segundo relatório da Pesquisa de Condições Socioeconômicas e Violência Doméstica e Familiar.

Quando uma mulher é agredida fisicamente, por exemplo, maior do que a dor física é a dor psicológica que deixa cicatrizes muito mais profundas e que dificilmente serão apagadas, as quais podem resultar em sequelas que comprometam, inclusive, a sua autoestima, capacidade laboral e produtividade no trabalho.

É o que demonstra a pesquisa, que também constatou que as vítimas de agressão dentro de casa faltam ao trabalho 18 dias por ano e passam menos tempo empregadas numa empresa – 58 meses contra 78 meses passados por aquelas que não sofrem violência.

Trata-se de um quadro que também se reflete nos salários pois, de acordo com a mesma pesquisa, as vítimas de algum tipo de abuso ganham 10% menos que as que não sofreram agressão. Um dado que acentua ainda mais a distinção salarial entre homens e mulheres, já que as trabalhadoras, de modo geral, ganham 17% a menos que os homens. Ainda assim o salário médio de uma profissional branca vítima da violência (R$ 9,79 por hora) é maior do que a de uma profissional negra que não sofre agressão (R$8,16 por hora).

Outro quadro agravante revelado pela pesquisa é o número de profissionais insatisfeitas com seu serviço, que cai de 43% para 33% quando se consideram as vítimas de violência doméstica. Uma insatisfação que pode ser ocasionada pela desmotivação e perda da autoestima das mulheres agredidas. Ainda segundo a pesquisa, 23% das vítimas de violência doméstica nos últimos 12 meses disseram ter desistido de alguma oportunidade de emprego para não contrariar o parceiro, o que contribui assim para ampliar sua dependência financeira em relação ao companheiro.

Instituída pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a lei 11.340 de 7 de agosto de 2006, conhecida como lei Maria da Penha – em homenagem a uma jovem de 23 anos vítima de tentativa de homicídio por arma de fogo, que a deixou paraplégica, e por eletrocussão e afogamento – tem o intuito de criar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Mas o cenário ainda é muito devastador, considerando que não existe um número exato de vítimas da agressão em razão do número de mulheres que optam por não denunciar os agressores.

Desta forma, os pesquisadores da UFC sugerem que as próprias empresas apoiem suas empregadas por meio, por exemplo, de medidas preventivas – como programas de educação sobre violência doméstica para os supervisores, funcionários e, especificamente, equipe de segurança, podendo ajudar assim as vítimas – medidas protecionistas – como de assistência jurídica, mudanças no horário de trabalho para evitar perseguições da empregada pelo agressor, segurança pessoal até o seu veículo, entre outros – e medidas intervencionistas – como programas de assistência aos empregados, fundos de emergência, aconselhamento etc.

Os motivos para que as empresas invistam em tais ações, como fomentado pelos próprios pesquisadores, está primeiramente na violação dos direitos humanos daquelas que possuem vínculo empregatício com as corporações e, segundamente, por motivos práticos que não devem ser desconsiderados: a queda na produtividade empresarial e consequente aumento de gastos da empresa com a saúde física e psicológica de suas trabalhadoras, vítimas da violência.

Portanto, analisar a agressão contra mulheres do ponto de vista econômico é algo que precisa ser cada vez mais corroborado para que as organizações enxerguem o todo e constituam mais um meio de grande auxílio no combate a um mal que, infelizmente, ainda acomete tantas vítimas não só no Brasil como no mundo todo.

* Mariana da Cruz Mascarenhas é jornalista e especialista em Comunicação Organizacional e Metodologia do Ensino na Educação Superior. Mestranda em Interdisciplinaridade em Ciências Humanas. Articulista e crítica de Economia e Cultura, já escreveu matéria do Vaticano, além de muitos outros trabalhos jornalísticos realizados em São Paulo.
www.marianamascarenhas.com

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