Para. Eu quero descer.

1970 1

* Maristela Prado – Não foi nesse mundo que nasci, não foi nesse mundo que me criei e cresci feliz. Não reconheço mais a vida, parece tudo tão diferente de antes… Éramos muito mais felizes, embora as diferenças sempre existiram, mas em outra situação.

A hierarquia é necessária para que haja uma direção, senão viveríamos cada um fazendo o que achasse melhor ou certo. Que bagunça seria? Mas nos colocaram nessa bagunça sem percebermos, cada um faz o que quer e como acha melhor, para si. O resto, que resto? Esse não precisa viver, não precisa se preocupar, basta trabalhar, incessantemente, quase sem idade para parar, assim alguns trabalham e outros não, fingem que trabalham, fingem que têm competência, fingem que fazem, fingem.

Não me lembro de ter vivido essa experiência tão suja um dia, e olha que sou filha da ditadura, essa que massacrou, torturou, perseguiu, exatamente quem fazia a baderna, que promovia a bagunça, que achava que podia e fazia o que bem entendesse. Trocamos as posições, os baderneiros foram para o “poder” e nós, aqueles que seguiam em paz, trabalhavam e se aposentavam para descansar depois de anos de dedicação, é que sofremos a repressão, a baderna feita com nosso dinheiro, trocado em milhões e milhões para cada nome sujo, condenado e jogado na lama nacionalmente.

É mesmo? Não, a lama deles é diferente da nossa, é em mansões, condomínios e duplex, continuam vivendo com o dinheiro do povo, muito confortavelmente. Não usam algemas, usam tornozeleiras por debaixo das calças caríssimas, ninguém vê, afinal não são bandidos, como se chamava antes, criminosos do colarinho branco.

No meu mundo não ficávamos à deriva sendo dispensados de empresas por causa de crises, as pessoas permaneciam anos na mesma empresa, funcionário antigo era valorizado, hoje é jogado fora para contratar quem está começando, sem experiência, para pagar menos e sem ter alguém que os oriente para se tornarem grandes também.

Os jovens estão perdidos, as Universidades despejam aos montes, todos os anos, jovens formados e sem emprego. Descartam logo que se termina o estágio. Não há mais vagas para tantos. A exigência ficou absurda, fazem pós-gradução, doutorado, mestrado, MBA, inglês fluente, mas nada disso os faz bons o suficiente para uma vaga, pois não têm experiência. E nunca terão, se ninguém lhes der uma chance

Não temos direção, não temos um comando sério, não temos ninguém. Estamos vivendo cada um por si. Não sabemos onde vamos chegar, mas sabemos onde cada um chegou longe dos nossos olhos, assistimos todos os dias a degradação de uma Nação, o caos, a desordem e o abandono. Para, eu quero descer, quero minha vida de volta, quero ter orgulho do meu País e não vergonha.

* Maristela Prado é Bacharel em Letras e revisora de textos, casada e mãe dois filhos adultos. Leia mais no blog As Letras da Vida

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1 comentário on "Para. Eu quero descer."

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