Basta ao humor fascistóide. Não passarão!

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 * Dojival Vieira – Um grupo de pseudo-humoristas sem nenhum talento, com tendências claramente fascistóides resolveu que negros, portadores de deficiência, mulheres, crianças e homossexuais, em suma, os setores sociais mais vulneráveis, tem uma única função: servir de alvo para a expressão da sua mediocridade e da sua total falta de noção quanto aos limites da vida em sociedade e num Estado Democrático de Direito.

O mais recente caso envolvendo o músico Raphael Lopes, comparado a um “macaco” no show de horrores promovido numa casa noturna de S. Paulo, pelo pseudo comediante Felipe Hamachi, expõe e revela que estamos diante, não apenas de uma piada racista (sem a menor graça como toda piada, que tem como fim botar no lixo a dignidade humana) mas de um fenômeno político que se manifesta nesse tipo de humor com traços abertamente fascistóides e nazistóides.

Seu objetivo é depreciar a condição humana, é naturalizar a violência contra negros e demais setores vulneráveis, é banalizar o que há de essencial na vida. Negros, portadores de deficiência, mulheres, crianças são transformados, nesse contexto, na escória, cuja única utilidade é servir de matéria prima do riso fácil para meninos bem-nascidos. É fascistóide precisamente por isso.

É covarde, porque seu alvo são os discriminados, numa sociedade capitalista que se alimenta da exploração e da exclusão.

Por isso quando um certo Bruninho Mano, no mesmo referido bizarro show, afirma que “é melhor comer uma criancinha de 5 anos do que uma cadeirante porque a cadeirante não tem firmeza nas pernas”, e uma platéia idiotizada acha graça na perversão, estamos diante da negação pura e simples, de valores civilizatórios que custaram séculos para se consolidarem na vida em sociedade.

Essa espécie de humor como toda a tendência fascistóide é regressiva. Provavelmente há séculos, antes da humanidade atingir o estágio civilizatório em que nos encontramos, comunidades primitivas deviam achar graça nesse tipo de piada.

Que ainda hoje filhos da classe média paulistana paguem ingresso e se divirtam com esse tipo de aberração, é apenas o sinal o perigo representado por impulsos primitivos e pela barbárie, precisa ser identificado e derrotado. Enquanto é tempo.

Convêm nunca esquecer a lição de Bertolt Brecht em “No Caminho, com Maiakósvski”.

(…) Tu sabes,
conheces melhor do que eu
a velha história.
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho e nossa casa,
rouba-nos a luz e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
Nos dias que correm
a ninguém é dado
repousar a cabeça
alheia ao terror.
Os humildes baixam a cerviz:
e nós, que não temos pacto algum
com os senhores do mundo,
por temor nos calamos.
No silêncio de meu quarto
a ousadia me afogueia as faces
e eu fantasio um levante;
mas amanhã,
diante do juiz,
talvez meus lábios
calem a verdade
como um foco de germes
capaz de me destruir. (…)

Soa patético ouvir tais figuras invocando o direito a liberdade de expressão para cometerem tais atrocidades. Querem destruir nas pessoas o que elas tem de mais elevado – que é a sua dignidade humana – e preferem fazê-lo contando com o nosso silêncio cúmplice.

Pretendem, com a arrogância que é peculiar a quem se acha acima do bem e do mal que, ao denunciá-los, estejamos praticando censura como se, até mesmo o direito de parar a mão do carrasco em legítima defesa, tivéssemos perdido.

Chega! Basta!

Os setores vulneráveis que resistem e lutam para manter sua dignidade numa sociedade injusta, racista, homofóbica e de exploração, não aceitam serem transformados numa espécie de “Geni” da meia dúzia de “mauricinhos”, transformados em celebridades instantâneas pelas redes sociais.

A luta do músico Raphael Lopes, que teve a coragem de denunciar os pseudo-humoristas reunidos no show bizarro, que não por acaso levou o nome de “Proibidão”, é a luta de toda a sociedade brasileira que rejeita a regressão e a barbárie e repudia o atentado à liberdade de expressão que é a ação fascistóide de tais humoristas.

Todas as medidas, no plano penal, com a abertura de Inquérito e investigação para apurar a autoria e a materialidade dos crimes cometidos; no plano administrativo, com a aplicação da Lei 14.187/2010, que pune o crime da discriminação racial na esfera administrativa; e no plano cível, com a indenização por danos morais, já estão sendo tomadas junto às autoridades responsáveis, para que a impunidade, mais uma vez, não prevaleça como é tradição nesse país de impunidades.

Essa onda do politicamente incorreto que envereda para o políticamente criminoso, não é humor, nem arte: é apenas a expressão política de grupos com tendências fascistóides e ausência de talento em busca de notoriedade fácil.

Não passarão…

 

* Dojival Vieira é jornalista, advogado, poeta e presidente da ONG ABC Sem Racismo, além de Jornalista Responsável e Editor da Agência Afropress (www.afropress.com). Sugestões, criticas ou elogios: abcsemracismo@hotmail.com e dojivalvieira@hotmail.com ou pelo site www.afropress.com

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